segunda-feira, abril 1

Dicas de manejo permacultural para os caprinos

Antônio Roberto Mendes Pereira 

A tentativa de produzir proteína animal de forma ecologicamente correta, é o objetivo de muitos produtores que utilizam a agroecologia como ciência norteadora para a implantação e operacionalização do seu sistema produtivo. E a Permacultura é um dos métodos operacionais para a prática destes princípios. A demanda por proteína animal produzida com menos energia e com menos uso de insumos externos é à base de preocupação deste texto. 


Uma crescente população vem demandando diariamente por alimentos sanos e saudáveis, e que prolongue a vida das pessoas. Esta demanda vem forçando de forma natural que os produtores de alimentos repensem sua forma de produzir, de beneficiar e de vender. 

Não queria trazer aqui na escrita deste texto somente a preocupação da produção de produtos orgânicos para o mercado, já que este tipo de produto está em alta, mas trazer a preocupação da produção de produtos limpos e ambientalmente corretos como postura idônea e responsável de qualquer produto agropecuário. Não ser atraído apenas pelo plus do preço pago pelos orgânicos no mercado, mas pela preocupação com o meio ambiente e com o futuro do mesmo. 

A PRESENÇA DOS ANIMAIS NO AGROECOSSISTEMA 

Não podemos esquecer que os animais devem compor a estrutura produtiva sustentável de todas as propriedades rurais. Sem a presença dos mesmos, muitos serviços ambientais necessários deixaria de acontecer. Os animais são grandes recicladores de matéria orgânica, além de aumentar a concentração dos minerais durante a realização do seu metabolismo alimentar. Muitos dos minerais e sua mistura vão ser encontrados nas feses destes animais de forma concentrada. 

Portanto a escolha das espécies que vão ser criadas nas propriedades precisa seguir certos critérios de adequação. O clima é um limitante na escolha destas espécies que irão ser criada, logo este critério precisa ser respeitado. 

Uma espécie animal que me chama muita atenção para os climas áridos e semiáridos são os caprinos. São animais inteligentes, adequados para os ambientes secos e quentes, tem uma larga dieta, alimentando-se de uma infinidade de vegetais frescos e secos, e além de tudo são muitos resistentes as mudanças de temperatura do meio onde vive. 

DICAS PARA O MANEJO DOS CAPRINOS 

É uma das espécies mais indicadas para a criação nos sertões e nas propriedades que ainda não estão diversificadamente evoluídas. Não é recomendado para ser criadas em áreas úmidas. É uma espécie contrária ao excesso de água e temperaturas com alto grau de umidade relativa. 

O grande limite para a criação dos caprinos de forma ecológica refere-se à produção de forragem e grãos na sua alimentação, face ao pequeno tamanho de muitas propriedades. A escassez de rações orgânicas para suplementar na seca, à baixa fertilidade do solo nas áreas escolhidas para pastagens, ao pouco uso da prática da adubação verde e ao clima desfavorável em determinada época do ano. 

A tentativa de plantar cereal de forma orgânica, como milho, soja, e outros vegetais para a alimentação dos animais necessita de uma certificação externa que comprove o sistema de produção que está sendo utilizado. Desta forma tornando-se inviável e em muitos casos não competitivo, que ao se tornar certificado alcançará preços mais elevados para os mercados internos e externos. 

Nos sistemas de produção orgânica de carne, recomenda-se que a alimentação destes animais seja equilibrada e que supra todas as necessidades desta espécie animal. Qualquer suplemento que venha ser oferecido deve ser isento de antibióticos, hormônios e vermífugos. São também proibidos aditivos, promotores de crescimento, estimulantes de apetite, ureia etc. 

Uma das melhores formas de alimentar estes animais é criando espaços de pastos naturais bastante diversificados que se possa manejar através de rodízio de piquetes. Espaço este, onde os animais passam determinado período e logo após mudam de piquetes fazendo um rodízio com as demais áreas dos piquetes. Quanto menos intervenção humana melhor. Permitir que estes animais se criem, é ainda a melhor opção para quem quer praticar uma criação que atenda aos moldes de uma produção de animais orgânicos com menos investimentos possíveis. 

Outra forma complementar de manejo orgânico de criação é com o uso de pasto cultivado, utilizando-se como estratégia o pastoreio rotativo ou pastoreio Voisin onde a definição utilizada de pastoreio é “O encontro entre o animal e o pasto”. O pasto e o animal que pasta são dois seres interdependentes e mutuamente necessários, um não vive sem o outro, ambos se complementam. Se o encontro for harmonioso, ambos saem fortalecidos, se o encontro é conflituoso ambos definham ou perecem. 


O pastoreio Voisin nada mais é que uma mini-migração dos animais, orientada pelo homem. O método, por ser extremamente natural responde à concepção ecológica, pois, com ele, a natureza “brota e rebrota” cada dia mais, como um renascer da vida natural. Esta tecnologia tem como objetivo aumentar a produtividade dos pastos e seu valor biológico, podendo, ainda, acelerar o ganho de peso nos animais. 

Para executar o pastoreio rotativo é indispensável considerar as seguintes premissas estabelecidas por André Voisin, sendo duas para os pastos e duas para os animais. 

1. Lei dos Pastos: Tempo de ocupação – Retirar os animais do pasto a tempo, evitando a permanência deles quando do surgimento do rebrote. 

2. Lei dos Pastos: Tempo de descanso – Deixar descansar a área de pasto o período suficiente para que o mesmo possa se recuperar para um novo ciclo de consumo dos animais. 

3. Lei dos Animais – Permanência dos animais no pastoreio não deve superar a três dias de cada vez. Isso porque, ao final desse prazo, as dejeções e as plantas estão pisoteadas demais, formando uma massa mal cheirosa, que os animais passam a rejeitar para o consumo. 

4. Lei dos Animais – O pasto desejável, para incrementar o consumo, é aquele que atinge entre 15 cm a 25cm de altura. É a altura ideal, que enseja o maior consumo com mais economia e qualidade. 


Uma intervenção humana aceitável no manejo alimentar dos animais é o manejo da caatinga. 


A vegetação de caatinga é conhecida do sertanejo, sendo sua companheira e auxilia na sobrevivência no semiárido, produzindo alimentos, forragem para os animais, produtos madeireiros e disponibilizando uma vital fonte energética, tanto para consumo doméstico quanto para atividades produtivas. O manejo deste bioma deve fazer parte da vida cotidiana dos habitantes, mantendo um sistema vivo, equilibrado produzindo de forma permanente. 

A vegetação de caatinga tem um porte geralmente baixo e apresenta enorme capacidade de rebrota quando cortadas e reagem rapidamente às primeiras chuvas. É uma característica que precisa ser trabalhada para ajudar na montagem de sistemas produtivos de animais orgânicos. Segundo os especialistas, uma vegetação cortada drasticamente leva de 9 a 14 anos para voltar ao porte original, inclusive em biomassa. Isso evidência a forte resiliência, ou capacidade de autoafirmação biológica, embora seja esperado um empobrecimento gradativo da biodiversidade se não forem tomados cuidados que minimizem esse efeito adverso. 


MANIPULAÇÃO DA CAATINGA PARA FINS DE PASTOREIO 

Segundo os pesquisadores a vegetação da caatinga produz, em média, seis toneladas por hectare ao ano de fitomassa nas partes aéreas, sendo duas toneladas de madeira e quatro toneladas de folhas, flores e frutos. Dessas quatro toneladas, 90% advêm de espécies lenhosas, sendo que desse percentual, até 70 % das espécies podem ser potencialmente forrageiras (Araújo Filho, 2006). 

Diante deste potencial apenas 7,0% do total da produção de biomassa estão disponíveis para o consumo animal, sendo que na época chuvosa a disponibilidade é proveniente principalmente da rebrotação de arbustos e, na estação seca, da queda de folhas de árvores caducifólias (que solta às folhas em um determinado período). Por esse motivo, a produção pecuária na caatinga apresenta baixos índices de produtividade. 

Os níveis de manipulação da caatinga são o raleamento, o rebaixamento, associação entre raleamento e rebaixamento e o enriquecimento de áreas raleadas com espécies vegetais introduzidas. Os três princípios que tornam essa manipulação uma prática sustentável são: preservação de até 400 plantas por hectare (40% de cobertura), nível de utilização da forragem de no máximo 60% e preservação da mata ciliar em toda a malha de drenagem da pastagem. 

CONHECENDO MAIS DETALHES 

RALEAMENTO - O raleamento da vegetação lenhosa da caatinga consiste no controle seletivo de árvores e arbustos, com o objetivo de obter-se incremento da produção de fitomassa do estrato herbáceo. O preparo da área deve ser realizado na estação seca, reduzindo-se a densidade de árvores e arbustos para aproximadamente, 400 plantas por hectare, sem afetar sua biodiversidade. Devem ser mantidas as espécies de valor forrageiro, as de sistema radicular profundo e as de valor madeireiro ou paisagístico. Devem ser controlados os arbustos pioneiros, as espécies tóxicas ou que causam problemas aos animais e ao homem. 

No meio da estação chuvosa, recomenda-se o roço de todas as rebrotações das espécies que foram brocadas. Esta operação deverá ser repetida nos dois primeiros anos, para possibilitar um controle mais efetivo de espécies indesejáveis como o marmeleiro (Croton sonderianus). A manutenção da área raleada é obtida com roços na estação chuvosa e a cada 3-4 anos. No primeiro ano, o uso pastoril da área raleada só deverá ser feito após a maturação e queda das sementes das espécies herbáceas, ou seja, ao início da estação seca. 


REBAIXAMENTO - Consiste no corte (70 cm do solo) de espécies lenhosas para induzir a rebrotação de fitomassa de forragem a uma altura disponível para a escolha e consumo dos animais. O corte deverá ocorrer durante a estação seca, devendo ser rebaixadas as espécies de reconhecido valor forrageiro, tais como o sabiá, o mororó, a jurema-preta e o quebra-faca. 

Recomenda-se a retirada da madeira útil e o picotamento dos garranchos no local para decomposição e incorporação da matéria orgânica. Na estação das chuvas seguinte, as rebrotações dos arbustos não forrageiros devem ser roçadas para controle das espécies indesejáveis. Ao fim do período seco seguinte, proceder-se-á ao corte das rebrotações das espécies lenhosas forrageiras. Há, ainda, a opção de manter até dois ramos por toco, possibilitando também o desenvolvimento de até dois caules por planta para produção futura de madeira ou exploração da florada para a produção de mel. 

ENRIQUECIMENTO - Dos três métodos apresentados, esse é o único que apresenta aumento na disponibilidade de forragem, pois consiste na introdução de outras espécies dentro de áreas raleadas. A aplicação do método é iniciada com o raleamento da vegetação lenhosa no final da estação seca. Nesse caso, como haverá introdução de espécies e não haverá limitação de sombreamento para o crescimento dessas, a densidade deve permanecer entre 150 e 200 árvores por hectare (20% de cobertura). 

O plantio das forrageiras introduzidas deve ser realizado no período chuvoso sem a presença dos animais. O enriquecimento pode ser feito no estrato herbáceo ou no lenhoso. O importante é que sejam introduzidas espécies que apresentem persistência na área. Portanto, sugere-se o uso de espécies perenes. 

Em nível de estrato herbáceo podem ser utilizadas gramíneas como capim-buffel (Cenchrus ciliairis), capim-corrente (Urochloa mocambicensis), capim gramão (Cynodon dactilon), capim digital (Digitaria suazelensis). Para o estrato lenhoso, tanto espécies nativas (sabiá, mororó, quebra-faca) como exóticas (leucena, gliricídia e algaroba) podem ser introduzidas. 

Como podemos perceber através de um planejamento de manejo da vegetação nativa podemos ter e fazer a diferença na manipulação da criação dos animais. Entender do bioma no qual queremos inserir a criação de animais exige acima de tudo este conhecimento mais aprofundado. O aumento na disponibilidade de forragem na caatinga é a intenção deste manejo. 

As características de comportamento de cada espécie que vão ser manipulada devem ser consideradas e permitidas. No caso dos caprinos eles preferem serem criados livres, soltos, podendo ele mesmo perambular em busca de preparar seu cardápio diário. São animais espertos e tem muita facilidade para ultrapassar as cercas e principalmente se existe fartura de alimentos do lado oposto do qual esta inserido. 

Baixos níveis de recursos externos – É uma espécie animal que exige poucos insumos para serem criados, tem uma dieta diversificada aceitando alimentos tanto verdes quanto secos em forma de feno natural e manipulado. 

O CONTROLE DE ECTOPASITAS 

Para avaliar e reduzir o grau de infestação de ectoparasitas e verminoses nos animais são tomadas as seguintes medidas: descanso das pastagens por período de seis meses, homeopatia, tratamentos fitoterápicos à base de Nim (Azadirachta indica) e pó-de-alho, retirada do esterco das instalações e desinfecções periódicas com a cal, creolina e/ou vassoura de fogo. As desverminações com extrato do Nim são realizadas nos animais com número acima a 500 OPG (ovos por grama de fezes). 

ASPECTOS DA CONTENÇÃO DOS CAPRINOS A CAMPO 

É um dos grandes desafios na criação dos caprinos é sua contenção nos espaços selecionados para sua estadia. São animais muito ariscos e necessitam de uma boa cerca para manter os mesmos nos espaços desejados para a sua manipulação. É necessário uma boa cerca e com utilização de tecnologias apropriadas para este manejo. 


É preciso muita preocupação na construção das cercas para os caprinos, pois as mesmas exigem grande quantidade de madeira contribuindo enormemente para o desmatamento da caatinga. Ler texto “Cercando sem desmatar” deste mesmo blog. 



DICAS PARA A CONSTRUÇÃO DAS INSTALAÇÕES PARA OS CAPRINOS 

As instalações devem oferecer economia de uso de mão de obra nas tarefas diárias e facilidade no manejo e controle da sanidade dos animais. Se as instalações não estão atendendo a estas premissas precisa ser repensadas, buscando ao atendimento imediato da mesma. Os apriscos também deve ter planejamento para o armazenamento de forragens para atender as necessidades alimentares nos períodos de escassez  O terreno deve ser de textura bem consistente (duro, pedregoso) e com boa declividade de 2 a 5% para facilitar a drenagem; construída próximo à casa do agricultor; em instalações com área coberta, esta deve ser construída no sentido norte-sul, no maior comprimento. 

As instalações para os caprinos devem atender a certos pré requisitos indispensáveis: 

· Os animais não devem manter contato direto e permanente com as feses; 

· Disponibilidade de água de boa qualidade e não exposta ao sol; 

· As instalações devem ter e oferecer aos animais um conforto térmico adequado para os animais, sombra, solário, sem umidade, ventilado; 


· Que a quantidade de cochos para complementação alimentar seja adequado oferecendo um espaço ideal para cada animal, evitando disputas na hora da alimentação; 

· Que a localização relativa do aprisco leve em conta o gasto com energia durante a visita para o manejo diário, e as áreas de acesso aos piquetes ou qualquer outra área de pasto; 

· O aprisco precisa ter divisões para atender a um manejo de separação animal; 

· Que o design do aprisco seja bastante funcional, facilitando todo o manejo dos animais; 

· A construção do aprisco deve facilitar a retirada do esterco dos animais e demais medidas de limpeza e higienização do espaço; 

ÁREA COBERTA DO APRISCO EM RELAÇÃO A QUANTIDADE DE ANIMAIS 

Área coberta por categoria de animal 

· 1,0 m2/matriz 
· 0,8 m2/jovem de reposição (recria) 
· 0,5 m2/cria. 
· 3,0 m2/reprodutor 

Área Descoberta (curral) 

· Recomenda-se utilizar o dobro da área coberta para cada categoria de animal. 

· Quanto ao piso, deve-se utilizar material que permita uma boa compactação com uma boa drenagem. Escolher uma área com declive em torno de 2 % a 5 %. 

· Recomenda-se, limpeza quinzenal no período seco e diário no período chuvoso. 

· Aconselha-se construir, no compartimento destinado às crias, um estrado de madeira para o piso com ripas de 3,0 cm de largura, espaçado de 1,0 cm entre si, impedindo o acumulo do esterco e facilitando o escoamento. Ver detalhe nas imagens abaixo. Este tipo de piso permite uma grande higiene profilática na criação dos caprinos, podendo também se adequar a criação de outros animais. 



Espero que estas dicas possam contribuir na melhoria efetiva da criação dos caprinos para quem já cria e para aqueles que pretendem iniciar esta atividade. A funcionalidade quando levada em consideração no planejamento contribui de forma significativa no manejo para o sucesso da atividade econômica ou apenas para o consumo familiar. Mão a obra. 

01 de abril de 2013

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