sexta-feira, dezembro 21

A excelência do nativo na pequena propriedade rural - Resistência e adaptabilidade as condições adversas

Antônio Roberto Mendes Pereira

A escolha da espécie animal e dos vegetais que vai ser cultivados e criados na propriedade rural é um passo decisivo no sucesso da atividade. Uma escolha errada gera uma seqüência de atropelos nos resultados esperados, levando os produtores a abandonar a atividade pelos baixos resultados muitas vezes alcançados. 

No nordeste estes enganos na escolha destas espécies, levam muitos produtores a grandes perdas no plantel e nos cultivos. Este erro acontece normalmente porque muitas vezes as espécies escolhida não se adéquam ao ambiente, e as condições locais de disponibilidade de várias necessidades para atender as demandas destas espécies selecionadas, entre elas a quantidade de água, alimentos, radiação solar entre outros. 


Historicamente falando algumas espécies de animais e vegetais comestíveis criadas e cultivadas no Brasil, foram trazidas pelos portugueses na época do descobrimento do Brasil. Os bovinos, caprinos, ovelhas, e algumas raças de galinha foram alguns dos exemplares trazidos por estes colonizadores, além de várias espécies de vegetais, como frutas, hortaliças, etc. Muitos desses animais e vegetais foram adaptando-se aos ambientes onde foram submetidos a serem criados. Mas, mesmo assim estas raças têm preferências por determinados ambientes, climas, alimentação e manejo. E é justamente em algumas características ou aptidões de preferências que muitos agricultores pecam durante a escolha. 

Geovergue Medeiros, afirma que estes animais que foram trazidos sofrerem uma seleção natural ocorrida ao longo de muitos anos (desde o descobrimento do Brasil) e adquiriram importantes características de adaptação às condições ambientais do semiarido e muitos destes hoje são considerados animais nativos. Estes animais para se adaptarem ao clima modificaram algumas características do seu organismo, por exemplo, reduziram o tamanho do corpo, diminuíram a produção de leite, e aprenderam a utilizar muito bem as plantas da caatinga como alimento. Conseguem também ficar mais tempo sem tomar água, desenvolveram uma forma de eliminar o calor corporal mais rápido e até fortaleceram seus cascos para caminhar, nos diversos tipos de solo existente na região semiárida, que em algumas regiões são muito pedregosos. 

No sertão, por exemplo, existe uma insistência dos produtores em criar bovinos, estes animais sofrem muito para resistirem às intempéries do clima e da alimentação a eles oferecidos. As características da região estão muito mais adequadas a animais que suportem mais calor, que consigam encontrar alimentos neste tipo de ambiente (caatinga) e que consigam sobreviver com a pouca quantidade de água encontrada neste ambiente. Os animais de menor porte como os caprinos, são os mais adequados ao ambiente, ora apresentado. 

A vegetação nativa quando comparada com os pastos cultivados são muito mais resistentes as intempéries que venham a ocorrer. E a capacidade de suporte da caatinga consegue acomodar muito mais os caprinos e os próprios animais nativos ou silvestres que neste ambiente nasce, cresce e vive, quando comparado aos bovinos. 

Os caprinos até parece que foram moldados para ser criados neste bioma diversificado, porém muito frágil e resistente. Logo, diante deste fato já comprovado por muitos agricultores deve-se levar em consideração, que para cada região, as formas de promover a segurança alimentar, em grande parte, são específicas. Promover o desenvolvimento sustentável destes recursos disponíveis em cada região e em cada propriedade deve ser uma das metas que devem servir de orientação. Para o semiárido nordestino, uma das fontes de renda que vem contribuindo para o desenvolvimento e sustento de muitos agricultores de base familiar, tem sido verdadeiramente a criação de caprinos e ovinos. 

Outro exemplo, agora ligado aos galináceos é o tamanho dos ovos das galinhas caipiras, capoeira ou crioulas, como as conhecemos, em comparação com os ovos das aves de granja. As galinhas de granja também são descendentes das galinhas trazidas pelos colonizadores, mas também passaram por um processo de melhoramento genético aliado à boa nutrição, para produzirem ovos em maiores quantidades e tamanhos. Pelos mesmos processos passaram os frangos que produzem a carne que hoje consumimos. Isto foi importante porque se desenvolveu a indústria da avicultura que gera muitos empregos e renda para o País. 

Entretanto, os ovos e a carne das aves caipiras são bem menores, em termos de quantidade, porém com sabor diferenciado, chegando a ser mais saborosos e procurados. Além disso, essas aves caipiras são resistentes a muitas doenças. Estes animais são poucos exigentes em espaço e manejo, por isso, são criados soltos, em quintais, sítios e fazendas, com alimentação muito, variada e que nascem espontaneamente. 

Lamentavelmente, hoje grande parte dessas populações de animais nativos está ameaçada de extinção ou já foram extintos, devido principalmente aos cruzamentos sem controle com os animais de raças estrangeiras, na busca de aumentar os resultados produtivos, transcendendo a capacidade natural do ambiente. E qual será o problema se os animais e os vegetais nativos desaparecerem? 

Nosso país perderá um relevante patrimônio genético que foi formado há mais de 500 anos e perderá importantes genes que poderiam ser utilizados futuramente para melhorar a genética dos animais nesses tempos de aquecimento global. E o que fazer para que essas raças não desapareçam? Será necessário o esforço de todos nós para que possamos, não só quanto preservar o ambiente, mas também conservar e preservar estes animais e vegetais nativos. 

A conservação, o melhoramento e o uso das raças nativas do Nordeste é significativo não somente em relação aos aspectos científicos, culturais, sociais e históricos, mas também econômicos, visto que essas raças constituem a base inicial para uma pecuária produtiva, no ecossistema do semiárido (Geovergue Medeiros). 

CONHECENDO A CAPACIDADE DE SUPORTE DA CAATINGA PARA OS ANIMAIS 

MONTANDO BANCO DE SOBREVIVÊNCIA ANIMAL – Diante desta seca atual, podemos aprender e reaprender muita coisa com o bioma caatinga. A maioria dos pastos cultivados não suportou a estiagem prolongada, e uma das únicas fontes de alimentação que resistiu foram algumas plantas da caatinga, que por estarem adequadas ao ambiente, ou melhor, por serem nativas, conseguem resistir durante muito mais tempo que qualquer outra cultura cultivada. Esta foi uma das grandes alternativas para os produtores neste período de escassez. 

Plantas como o mandacaru, feijão bravo, facheiro, juazeiro, jurema, pau ferro, camará, maniçoba, inço, angico, são alguns dos representantes que sobrevivem bravamente a seca, e ainda consegue com suas folhas, vagem e miolo, servir de alimento para muitos dos animais criados e silvestres. Estas plantas mesmo tendo espinhos e aparência que muitas vezes nos fazem pensar que os animais não vão aceitar como alimento, e nos surpreendemos com o apetite com que os animais a devoram, motivados é claro também pelas circunstâncias climáticas. É um casamento perfeito, animal nativo alimentando-se dos vegetais também nativos e adaptados. É a natureza tentando nos mostrar o como fazer, é educação ambiental de sustentabilidade. Todo o trabalho de manutenção seria diminuído se imitássemos a natureza. É obvio que também se teria os vegetais e as pastagens cultivadas, este trabalho de conservação e implantação seria mais uma alternativa para se ter uma criação com mais sustentabilidade e segurança. 

Então diante deste contexto, podemos nos perguntar e por que não fazer plantio destas plantas? Porque não aproveitar de todo este potencial já adequado, já nativo para se ter uma reserva para qualquer eventualidade? 

Estas plantas sendo cultivadas poderiam ser uma reserva de emergência, um banco de sobrevivência, para atender a qualquer desastre fenomenológico ligado diretamente a secas prolongadas. Este poderia ser um tipo de roçado de verão. 




Preservar o ambiente e o patrimônio genético deve ser uma prioridade em qualquer propriedade quer esteja localizada no sertão ou em qualquer outra região. A sobrevivência do ambiente depende desta preservação. O nativo deve existir em maior quantidade que o cultivado. 

Quanto mais estimulamos e aproveitamos o potencial das plantas e dos animais nativos, mas sustentável estamos tornando este ambiente. Logo, se estas plantas e animais por si só já nascem espontaneamente no ambiente, imagine se pudéssemos cultivá-los e criá-los! Fazer roçados e criações, é o que se quer divulgar. E a partir destes plantios e criações ir selecionando as plantas e os animais mais produtivos, as que dão mais folhas, as que suportam extremos de temperatura, os que conseguem produzir mais. Fazendo isto, estamos adequando e selecionando um material riquíssimo para a nossa propriedade. 

GRANDE DETALHE DO MANEJO DOS QUE VIVEM BEM NA CAATINGA 

Já que um dos animais mais adequado ao sertão é o caprino muitos produtores na perspectiva de elevar o nível de produção dos rebanhos leiteiros, tem optado pela criação de raças especializadas, como a Saanen e Parda Alpina, contudo, ainda não foi determinado um sistema de produção adequado que permita a máxima expressão do potencial genético dessas raças no semiárido. Sendo, portanto, necessários estudos para determinar o melhor sistema, de forma que possa integrar os fatores nutricionais, ambientais e econômicos, visando à sustentabilidade dessa atividade no semiárido, pois as raças especializadas para produção de leite são geralmente exigentes quanto à alimentação e ao conforto térmico. Quando não são atendidas, a tendência é ocorrer uma adaptação e seleção natural com base na tolerância à adversidade em detrimento da produtividade do rebanho causando prejuízo e muito trabalho para manter este rebanho bem alimentado alimentando-se de plantas nativas (Souza et al., 2011). 

Neste texto não vou citar nomes de raças, mas alertar que a melhor raça para o ambiente é aquela que mais adequada esta ao ambiente. O nativo pode produzir menos, mas também é menos exigente, come menos e sabe aproveitar ao máximo a forragem nativa que existe no ambiente. Adoece menos, pois está mais adaptada aos extremos e aos problemas locais. É menor mais também esta adequada a altura da vegetação que também não é grande. Sofre menos com as intempéries quando comparada com as raças vindas de fora. 






Esta mesma regra vale também para as plantas que se quer cultivar, quando mais nativa melhor, e a lógica se repete. O que vale é ser e ter animais e plantas sustentáveis ao ambiente que se tem. 

Logo, não se pode esquecer que a escolha da raça depende de vários fatores, tais como a finalidade, o mercado, a localização, o clima, características de adaptação dos animais e do nível tecnológico adotado pelos produtores. 



O técnico Nilton de Brito Cavalcante, da Embrapa Semiárido, diante dos transtornos trazidos pela seca, recomenda aos agricultores o cultivo do mandacaru. A dez anos ele vem analisando o plantio desta cactácea e vem obtendo excelentes resultados a começar pela produção. Ele vem utilizando um espaçamento de 1m x 1,5m – o que equivale a mais de 6.660 plantas/ha. Neste espaçamento consegue-se colher cerca de 30 ton./ha com o corte dos brotos que nascem no período. No décimo ano do plantio, a produção pode alcançar 285 ton./ha de massa verde e 48 ton./ha de matéria seca. 

ALTERNATIVAS NATIVAS PARA UMA MELHOR CONVIVÊNCIA COM A SECA 

Plantio de Pornunça (Manihot sp.) – É uma planta arbustiva-arbórea perene, nativa da região semiárida conhecida também como Pornúncia, Prinunça, Pornona, Mandioca de sete anos ou Maniçoba de jardim. Originária do cruzamento natural da Mandioca (Manihot esculenta Crantz.) e da Maniçoba (Manihot glaziovii Mull.). Assim como outros híbridos, possui características intermediárias entre as duas espécies, além de ser tolerante ao estresse hídrico, solos pobres e ácidos. Por muito tempo, foi muito utilizada como planta ornamental e na produção de farinha. 


Segundo os pesquisadores da EMBRAPA as plantas têm nomes estranhos, pornunça e pustumeira, mas os pesquisadores do Semiárido identificaram nelas qualidades muito procuradas por agricultores familiares das áreas dependentes de chuva do Nordeste: resistência à seca, alto teor de proteína e produtividades elevadas. Por isso estão expostas na Feira SemiáridoShow, que acontece na cidade de Petrolina-PE, de 5 a 8 de outubro. 

As duas espécies estão entre as plantas recomendadas como forrageiras para uso em sistemas de criação caprina, ovina, bovina e pequenos animais. Ambas apresentam bons níveis nutricionais e são bem consumidas pelos animais. São características que tornam as duas “excelentes” reservas para períodos de estiagem e fazem crescer o interesse pelo cultivo comercial dessas plantas nativas da região. 

Capim nativo – Precisamos também dispor de áreas onde o pasto seja de capim nativo. Eles na sua maioria não tem o rendimento de biomassa tal quais os capins cultivados, mas com certeza tem várias vantagens que os cultivados têm muito pouco, que é a resistência ao pastejo e a seca além da grande facilidade de rebrote. 


Plantio de Jurema (Mimosa hostilis Benth.) é uma arvore pertencente à família Fabaceae, da ordem das Fabales típica da caatinga, ocorrendo praticamente em quase todo nordeste brasileiro. Bem adaptada para um clima seco. Possui espinhos e apresenta bastante resistência às secas com grande capacidade de rebrota durante todo o ano. Da mesma forma que se pode construir um banco de proteína com a Leucena, por que não fazemos também um banco de proteína com a nossa nativa Jurema? 


Feijão-bravo (Capparis flexuosa) pertencente à família Caparaceae, uma espécie forrageira de porte arbustivo-arbóreo com folhas perenes. Desenvolve-se em muitas áreas da região semi-árida brasileira. Mantém-se verde durante todo o ano, o que se contribui para os animais uma planta de grande palatabilidade, pois geralmente não há disponibilidade de outra forragem verde para a alimentação, nas secas. São folhas quando fenadas (desidratadas) pelo sol atraem os animais para o consumo. 


Plantio de maniçoba – A maniçoba é uma espécie que se caracteriza por apresentar porte arbóreo e ou arbustivo, suas folhas são palmadas, ovais, glabras, verde claras, cobertas de matéria cerosa azulada. Suas flores apresentam geralmente cor roxa com inflorescência terminal. 

Segundo Soares (1989), o sistema radicular da maniçoba é bastante desenvolvido, formado por raízes tuberosas, onde acumula suas reservas, e proporciona a planta grande capacidade de resistência a seca, sendo uma das primeiras espécies da caatinga a desenvolver sua folhagem logo após o início do período chuvoso. 


Plantio de juazeiro – O juazeiro é uma planta perene, encontrada como vegetação natural, desde o interior do estado do Piauí ao norte de Minas Gerais. Ele ocorre em toda a região conhecida como caatinga. 

Os povos sertanejos o consideram uma planta especial, porque, mesmo em épocas de seca prolongada, está sempre verde e com flor. Essa alta tolerância à seca é motivada pelas suas raízes que atingem grandes profundidades. A árvore pode chegar a 12 metros de altura, mas geralmente fica com 5 a 6 metros. 

As flores são amarelas. Os frutos arredondados, de cor marrom, contêm polpa translúcida, sabor adocicado, levemente ácido, rico em vitamina C e em cada fruto contém uma semente. A propagação é feita através de sementes. 

Os animais se alimentam de folhas, ramos tenros e frutos. Nos períodos de seca prolongada, a planta serve de complemento alimentar dos animais. 


Como vemos ter o nativo como estratégia emergencial é uma grande decisão para as pequenas e médias propriedades rurais. É mais uma carta na manga para a sobrevivência no semiarido ou em qualquer outro local ou bioma. Sempre o adaptado por estar presente ao meio por mais tempo leva vantagens nos momentos de crise. Entre o trazido de fora e o nativo não existe comparação, sempre o nativo resiste mais. Não estamos querendo descartar o trazido de fora, mas estamos indicando nas propriedades devem ter áreas com os dois tipos de estratégias para os momentos bons e para os momentos de crise fenomenológica. 

21 de dezembro de 2012

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