sexta-feira, novembro 9

A floresta de alimentos da pequena propriedade rural - Frutifloresta, um espaço de coleta de alimentos


Antônio Roberto Mendes Pereira 

A idéia de ter uma floresta de alimentos encanta muitas pessoas. Já imaginou um espaço onde você e alguns dos seus animais domésticos pudessem encontrar 80% dos alimentos necessários? Pois bem, a intenção deste texto é ensinar a montar um pomar como se fosse uma floresta de alimentos, uma frutifloresta, onde a maioria das fruteiras adequadas ao tipo de solo e clima do local escolhido pudessem se desenvolver sustentavelmente. A diversidade vegetal e animal deve ser um dos princípios básicos desta floresta, onde cada elemento apóia e complementa as necessidades de outras espécies. Cada elemento que vai compor este sistema deve executar mais de uma função, para que este agroecossistema possa aumentar a sua capacidade de suporte de sustentabilidade. 


Na Permacultura este espaço é conhecido como Zona II, é o espaço também considerado como área de segurança alimentar para toda a família e para alguns animais. 


Em muitas propriedades este espaço já não existe, já foi absorvido pela monocultura comercial. Um pé ou outro de fruta ainda resiste às investidas de ser arrancadas. Em muitas propriedades já nem se lembra mais quando foi plantada uma fruteira, alegando-se que demora muito para produzir. O imediatismo é a postura que direcionam muitas das tomadas de decisões. Qualquer atividade que demande mais tempo é logo rejeitada. A rotação financeira rápida é o lema. Fazer investimento que demore muito tempo, utilize-se muito dinheiro e mão de obra é considerada decisão errada. O negócio é atividades que se invista pouco recurso econômico, e que gere resultados não para amanhã, mas para ontem. Como repensar esta forma de planejar é a intenção que deve permear este texto. 

Devemos partir do pressuposto de que em uma floresta não falta alimento para quem nela habita e vive logo, como montar esta Zona II seguindo a mesma lógica da floresta natural? O que devemos fazer? 

Como aproveitar de forma eficiente e eficaz a energia do sol? Do vento? Os nutrientes que estão presentes neste ambiente (solo)? 

A lógica é a seguinte: Em uma floresta natural e nativa para nós os seres humanos encontrarmos alimento que atenda nossa dieta de forma suficiente é difícil. Somente 10% a 20% é o percentual que podemos encontrar, porém nossa intenção é aumentar este percentual na floresta por nós montada. Pretende-se alcançar de 40% a 60% da dieta da família responsável por sua implantação. 


Em uma floresta de alimentos projetada, tudo ou quase tudo deve ser pensado, projetado, estudado, as plantas são escolhidas, selecionadas, com a intenção de atender as demandas da família e de outras famílias que não sejam unicamente as humanas. Muitos seres vão compor este espaço de forma que uma espécie apóia aos demais componentes do espaço. Precisamos aprender a aumentar a capacidade de suporte da floresta projetada, e muitas estratégias podem ser utilizadas, principalmente na escolha dos elementos que vão compor este espaço. 

Qual seria a lista das frutas que você gostaria de produzir? Porém, elimine as de impossível adaptação, pense no que for possível e adequado ao clima, ao solo, a quantidade de água disponível e a radiação solar que a área recebe. As espécies de frutas indígenas nativas devem compor este espaço, elas já foram testadas durante gerações e gerações, logo precisam compor este espaço. Dê preferência pelas nativas no lugar das importadas, trazidas de outras regiões. Porém nesta escolha nunca permita que de uma mesma espécie ultrapasse 10% do total das espécies que vão compor o espaço. 

ESTRATÉGIAS QUE PRECISAM SER ANALISADAS E OPERACIONALIZADAS 

REDUZIR A DISTÂNCIA DA COMIDA E DIMINUIR A NECESSIDADE DA COMPRA – Estas são as principais intenções com a implantação da floresta de alimento. Quanto mais próximo da casa menos gasto com energia para colheita e com a manutenção deste espaço. É de praxe na Permacultura que a Zona I e a Zona II, são espaços de segurança alimentar, devem ser similar ao supermercado para a família, ela deve ter quase todas suas necessidades alimentares atendidas por estes dois espaços produtivos. Espaços estes onde a família não precise se deslocar grandes distâncias para fazer sua feira ou coleta diária de alimento. Por estes alimentos estarem tão próximo da casa, evita-se o uso de geladeira para conservar os mesmos, a melhor maneira de conservar os alimentos é na própria árvore, só coletando o estritamente o necessário para o consumo diário. Com esta atitude a qualidade e a quantidade dos alimentos são mantidas, além de evitar a compra. 

O POSICIONAMENTO DA FLORESTA DE ALIMENTO – Um dos princípios da permacultura é o da “Localização relativa ou integrante”, onde o elemento está mais bem localizado quando ele consegue aumentar o nível de conexões entre ele e os demais elementos que compõe o sistema. Logo, quando se for escolher a área para montar o pomar ou a floresta de alimento, precisamos está atento a este principio. Embora que a melhor localização para esta floresta é logo após a Zona I, pois os critérios que precisam ser considerados são: produtividade, necessidade de água, energia e manutenção do espaço. A floresta não necessita de tanta manutenção quando comparada com a Zona I, portanto é posicionada logo a seguir. 

POMAR PARA TODAS AS CULTURAS – Quanto mais diversidade, mais rico e sustentável será este ambiente. Muitas culturas devem compor este espaço, porém sempre levando em conta, que quanto mais nativa a espécie for mais condições de permanência e produção terá. Devemos ter espécies de plantas que garantam uma produção durante todos os meses do ano. Neste espaço devemos ter plantas de vários andares (altura) para que possamos ao máximo imitar uma floresta nativa. É obvio que neste espaço não só terá plantas cultivadas, devemos entender que a natureza também vai querer incluir alguns representantes que ela acha necessário, respeite e controle o excesso. A diversidade deste espaço garante uma mesa diversificada, farta e rica, com alimentos de alta qualidade biológica ou nutricional. Garanta o resgate de espécies frutíferas da região que estão ficando esquecidas ou que seja difícil de encontrar, e ou que não estão sendo plantadas mais com freqüência. E lembre-se que a maioria das fruteiras requer máxima exposição ao sol e devem ser plantadas nas encostas voltadas para o sol, porém com o solo protegido da radiação solar é claro. 

Não perca as sementes e os caroços das frutas depois de consumidas. Não perca o potencial genético que foi produzido e agora necessita ser multiplicado. Faça uma pequena sementeira e aproveite ao máximo este material. Se não quiser fazer mudas pelo menos escolha uma área e lance as sementes em espaços que elas possam ter a capacidade e a possibilidade de se multiplicar espontaneamente, mas não transforme este capital genético em lixo. 


AS ESTAÇÕES DO ANO – Muita influência tem as estações do ano no desenvolvimento e produção das frutas, precisa-se está alerta para os períodos de cada estação climática. As fruteiras vão necessitar de alguns cuidados como em algumas estações a necessidade por água pode aumentar, em outras a concorrência com outras espécies mais adaptadas podem atrapalhar o desenvolvimento de algumas, em outros momentos o frio pode paralisar o crescimento, enfim precisa-se estar atentos para ajudar que as mesmas consigam ultrapassar estas possíveis dificuldades fenomenológicas. 

Na escolha das variedades dos representantes que vão compor o espaço devem-se selecionar espécies que possam ter alguns representantes produzindo durante todas as estações do ano. Garantindo que pelo menos parte do pomar esteja produzindo alimento naquele período ou estação do ano. 

Construir o calendário de safras das fruteiras existentes ajuda muito na manutenção do manejo do pomar. Pois no momento da floração até o fruto ficar no ponto de colheita muita coisa pode acontecer, logo é bom estar alerta. 

FORMA DAS COPAS DAS FRUTEIRAS – É preciso conhecer o formato e o tamanho de cada fruteira que foi escolhida para compor o espaço. Com isto respeitam-se as distâncias necessárias de cada espécie, evitando super dimensionamento entre as elas. O formato das copas vão nos ajudar na arrumação e na distribuição de quem deve estar próximo de quem. Vários são os formatos das copas, mas cada formato tem suas pretensões em uma serie de demandas que foram moldadas para atender a estas necessidades. 

Algumas fruteiras têm seus frutos expostos ao sol para amadurecer como no caso da mangueira, goiaba, laranja entre outras, estas necessitam de mais sol, mas também têm outras que protege seus frutos do sol, estes exigem menos sol para amadurecer, como é o caso da uva. Estes comportamentos das espécies precisam ser levados em conta na hora da arrumação. 






INTRODUÇÃO DOS ANIMAIS NA FLORESTA DE ALIMENTOS – Antes da tomada de decisão de quais animais domésticos irá fazer parte do sistema precisamos responder as seguintes perguntas: 

· Este animal é adequado ao clima? 
· Existem variedades adaptadas deste animal na região? 
· Qual será o impacto que este animal pode causar ao sistema? 
· Quanto de espaço este animal necessita? 
· Quais os hábitos deste animal em relação à reprodução? 
· Este animal pode ser criado junto de outras espécies? 
· Qual é o hábito alimentar deste animal? Dê preferência pelos onívoros, que comem de tudo. 
· Quais outras funções este animal pode desempenhar no sistema? 

É bom lembrar que animais grandes e destrutivos não são apropriados para serem criados na floresta de alimentos. Bovinos, cavalos compactam o solo, quebram muitas galhas além de comer muitos frutos. Os pequenos animais são mais adequados. Pássaros, abelhas, galinhas, coelhos, e até mesmo porcos, são mais adequados para participarem deste espaço produtivo. 


OS ANIMAIS E AS POSSÍVEIS FUNÇÕES NO SISTEMA – Todo ser vivo exerce várias funções no sistema onde está inserido. Estas funções colaboram na sustentabilidade do ambiente. Uma das grandes vantagens da criação dos animais livres é que eles podem exercer funções que consolidam sua existência no ambiente. Diferentemente de se criar um animal preso, para melhor entender imagine que uma galinha presa para provar sua existência basta que ela ponha ovos e produza carne, completamente diferente no caso desta galinha viver solta, ela prova sua existência controlando insetos, diminuindo as ervas, fertilizando o ambiente, entre outras. Como se percebe quanto mais este animal for criado utilizando a lógica da natureza mais funções ele pode exercer no ambiente, no nosso caso na floresta de alimentos. 

As abelhas exercem além da polinização exercem muitas outras funções de grande importância no sistema. A produção de mel, cera, própolis entre outros já justificam a necessidade de sua presença nesta floresta. Dê preferência pelas melíponas, pois não exigem caixas mobilísticas e muitos apetrechos para sua criação. Seu manejo também é muito mais simples que as abelhas do gênero Ápis. A presença de abelhas no sistema me exige mais cautela nas minhas atitudes de manejo. 

As galinhas são de grande ajuda no sistema, pois ciscam, comem insetos, controlam alguns tipos de ervas, contribuem na fertilização da floresta, espantam alguns tipos de cobras, além de contribuir com a diversificação e produção de alimento que é um das maiores intenções produtiva da floresta. 


Os patos e os gansos também são de uma ajuda tremenda, pois controlam grande variedade de gramas e forragem e outras ervas, ajuda na fertilização do solo e dos corpos d água do espaço. A fertilização da água contribui enormemente na alimentação de algumas espécies de peixes. Ajuda na oxigenação de lagos e lagoas através da sua movimentação dentro da água, contribuindo na sobrevivência dos peixes. Tem uma grande diferença das galinhas, pois não tem o hábito de cisca. De seis a doze gansos em meio hectare podem manter muito bem um pomar. 


Os pássaros também exercem funções importantíssimas no equilíbrio desta floresta, são eles responsáveis pela disseminação de parte de sementes de frutas e de outras plantas, quando se alimentam e também quando estercam, comem grande quantidade de insetos, além de tornar o ambiente mais bonito em beleza e na sonoridade. 


A ÁGUA NA FLORESTA DE ALIMENTOS – Sem ela o sistema não terá a estabilidade necessária. Várias estratégias precisam ser montadas para que este líquido possa ser captado e armazenado no solo. Um dos princípios da Permacultura diz que toda função importante deve ser executada por vários elementos, e a captação da água é função muito importante que precisa ser executada por vários elementos. A copa das arvores foram projetadas para naturalmente para captar os raios solares e água. 

O solo deve ser a grande caixa de água, onde toda água da chuva é captada e armazenada. As folhas que cobrem o solo, além de ser uma esponja que facilita a infiltração também serve de filtro limpando parte dos resíduos sólidos de arrasto. Uma boa estratégia para aumentar a quantidade de folhas que possam aumentar a proteção do solo é o plantio de cultivos de plantas de cobertura verde de solo. Estas plantas além de proteção também iram servir de adubação, durante sua decomposição. 

Açudes, canais de infiltração, lagos e lagoas são também estratégias que aumentam a captação e o armazenamento de água para o sistema. 




O JOGO DE ESPAÇO, LUZ E NUTRIENTES – Este é o grande desafio na montagem deste sistema, precisa-se aprender a equilibrar esta equação onde estes três componentes precisam interagir de forma permanente. A falta ou a demasia de um deles pode trazer problema para os elementos vivos que vão fazer parte deste sistema. Ao organizar a distribuição das fruteiras leve em conta a necessidade de luz e de espaço de cada espécie, identifique de que lado vem o sol e coloque as plantas mais exigentes neste lado. Aprenda aproveitar de forma eficiente tudo que esta disponível naturalmente nesta área. Lembre-se que toda fruteira necessita de espaço para se desenvolver adequadamente. 


ALIMENTANDO O POMAR – Após estabelecer as plantas de coberturas e as leguminosas que devem fazer parte deste ambiente, permitam que alguns animais entrem no sistema como exemplo galinhas, patos e dependendo da maturação do sistema alguns porcos, eles vão ajudar também a manter o pomar, suprindo o ambiente de adubo. Reviram, ciscam, pastam ajudando a manter o sistema vivo e ativo. 


MANEJO DE PRAGAS – Todo ambiente fértil e diverso dificilmente acontece o aparecimento de pragas e doenças. A estabilidade se instala com muita facilidade quando no ambiente a diversidade é instaurada. Vão existir insetos no sistema até porque eles também fazem parte do ambiente. Porém dificilmente se tornam pragas. A presença de inimigos naturais vai controlar quaisquer pequenos desequilíbrios que porventura venham ocorrer no sistema. Não fique surpreso se logo no início da instalação da floresta venha surgir estes desequilíbrios, lembre-se que o sistema ainda está buscando seus próprios equilíbrios estáticos de população de insetos. 

A PODA NO SISTEMA – Existe muita controversa sobre o uso desta prática. O formato natural de uma planta foi projetado naturalmente para que ela consiga atender a sua necessidade de luz, pois cada folha que brota tem várias tarefas e entre elas ela deve realizar fotossíntese em algum momento do dia, cumprindo uma das funções de ser folha. A poda desarruma esta projeção natural dos galhos, fazendo com que muitas das folhas não realizem esta função (fotossintetizar) por não receber a luz do sol. Outro detalhe da sabedoria e experiência popular diz que você sempre terá a mesma quantidade total de frutas de uma árvore. Você pode colher muitas pequenas e algumas poucas grandes, e com a poda você terá poucas grandes que terminam por equivaler pelo maior número das pequenas. Pense bem antes de tomar a decisão de realizar podas, uma vez fazendo todos os anos necessitará repetir a operação. 

Não é tão difícil montar uma floresta de alimentos que possam atender grande parte da necessidade de alimentos da sua família. Empenho e dedicação e observação dos sistemas naturais é a receita básica para grandes resultados. Esta floresta de alimentos precisa alcançar os seguintes pontos básicos necessários para a sustentabilidade: 

· Que ela auto se mantenha; 
· Que ela auto se regule; 
· Que ela auto se organize 

Busque montar sua floresta tendo como norte para serem alcançados estes três pontos básicos, e você se surpreenderá com os resultados. Você terá a satisfação de ter uma floresta particular cheia de alimentos, muita beleza, tranquilidade além de estar contribuindo com o equilíbrio do meio ambiente de forma intensa. 


08 de novembro de 2012


Um comentário:

  1. muito bom professor, dá vontade de estar logo numa terra para implementar uma floresta de alimentos, já comecei a pensar nas espécies( caju, goiaba, cajá, araçá, pitomba, ..., criar abelhas, aquicutura, e contemplar este sistema agroflorestal, aprender com ele,.... na parte sobre abelhas vc falou que se tiver abelhas na floresta de alimentos se precisa ter mais cuidado no manejo, gostaria de saber por quê? e quais cuidados são esses? grato professor, um abraço!
    Felipe Lins (estudante)
    felipe_all@yahoo.com.br

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