Antônio Roberto Mendes Pereira
Cada vez mais estamos nos alimentando de comida de NENHUM LUGAR, onde não se sabe a procedência, como foi produzida? Por quem? O que se utilizou para produzir? Enfim pouco se sabe sobre este alimento. A rastreabilidade ainda não faz parte da nossa cultura. O querer conhecer toda a cadeia ou teia produtiva, ainda não foi incorporado a nossa cultura e pouco é divulgado como uma forma de consumo consciente e de uma alfabetização ecológica em formação.
Outra medida que se torna a cada dia mais frequente na nossa cultura é comer alimentos fora de seu período de safra e vindo de fora da nossa região. A importação e a exportação de alimentos para atender a caprichos do só gostar disso ou daquilo de certas classes sociais, já é uma constante em muitas dietas. O atender estes caprichos cria uma rede de distribuição que transcende os espaços das cidades, dos estados e até países. Quanto mais distante vem este alimento mais caro ele se torna. Além de trazer uma série de riscos sanitários, podendo trazer consigo doenças, insetos. Isto é, não se importou apenas o alimento, mas também seus parasitas. Contribuindo para o aumento da lista de pragas e enfermidades presentes naquele ambiente. Sem contar com os gastos exorbitantes de energia gastas através deste translado do vai e vem de alimentos.
Outro grave problema que vem acarretando grandes problemas às propriedades rurais é a VENDA REPETITIVA do mesmo produto durante anos e anos, por mais que se faça rotação de área de plantio, este manejo leva a propriedade ao uso da monocultura induzida pelo mercado. Esta atitude produtiva mercadológica mais cedo ou mais tarde vai gerar conseqüências irreparáveis ao ambiente da propriedade, em especial ao solo. A retirada seguida dos mesmos minerais anos a fio, levará ao esgotamento de alguns minerais, necessitando a reposição de forma artificial e química.
Algumas dietas alimentares estão se tornando quase que universais alguns poucos produzem, mas todos comem. Não se respeita mais os ciclos produtivos (safras) dos produtos. Muitos cultivos que antes eram safristas hoje não são mais, já se produzem durante todo o ano na mesma propriedade. E quando não se consegue, são importados de outros espaços muito distantes.
A mídia coloca este ou aquele produto como o supra-sumo, o resolve tudo, aquele que cura este ou aquele problema de saúde. E a população pouco esclarecida termina por aceitar, legitimando a aceitação da divulgação através do poder de COMPRA. E com isto se manipula os preços, aumentando ou diminuindo a partir dos interesses não do consumidor, mas dos grupos que dele tem domínio ou monopólio.
Como vemos muitos são os problemas que estão atrelados a produção e a comercialização. Mas, para compensar, estão surgindo novas formas de enfrentar estes problemas. O encurtamento destes caminhos entre a produção e o consumo de alimentos vem surgindo com muita força nas comunidades rurais e urbanas. É a resposta que precisava ser dada, porém de forma pratica e exeqüível.
VALORIZANDO O JEITO DIFERENTE DE PRODUZIR, COMERCIALIZAR E COMER
A valorização desse jeito, passa pelo resgate das boas práticas alimentares ancestrais. Muitos hábitos alimentares foram esquecidos e trocados por alimentos commodities, que todos comem em todos os lugares. A variedade precisa ser resgatada, a criatividade de manipulação e uso dos alimentos locais ou nativos deve ser instigada. Novas formas de preparar estes alimentos necessitam acontecer.
Da mesma forma que novas antigas formas de praticar a agricultura vêm sendo divulgadas e utilizadas, a maneira de preparar e cozinhar precisa também passar por processos idênticos. A repetição é quase que a mesma coisa que, monoculturar também nossos hábitos alimentares, uma tendência em muitos hábitos alimentares. A permacultura vai de encontro a este sistema de produção/consumo.
Cada vez mais, novas, velhas e renovadas práticas e experiências que buscam aproximar, de diferentes maneiras a produção e o consumo de alimentos, vem sendo resgatadas, criadas e adotadas, como maneira de enfrentar esta onda de monoculturalismo em todos os âmbitos. A forma de comercializar também vem sofrendo transformações e adequações para poder atender a esta nova demanda ou necessidade das comunidades rurais e urbanas. O se livrar dos sistemas mercadológicos capitalistas, onde só um lado ganha vem sofrendo perdas mesmo que pequenas, mas de uma criatividade fantástica.
A forma de comercializar e de distribuir os alimentos produzidos por um sistema que utiliza agricultura de base ecológica provocou novas formas de operacionalizar este mercado de troca, de venda e compra. Muitas iniciativas ativam redes cujo desenho não obedece ao modo de funcionamento dominante nas últimas décadas em várias partes do mundo. Em vez de comida de nenhum lugar, cultivada sem se conhecer seu endereço, seu sistema de produção, embalada e transportada através de longas distâncias, ganham visibilidades crescentes a cada dia, a cada produção, a cada venda, caminhos alternativos criados na sua maioria pelos agricultores na busca da sobrevivência de sua família. O consumir alimento vem ganhando mais consciência ecológica, biológica. Da mesma forma que existe o código do consumidor que defende seus interesses também deveria ser criado o código do produtor, com a mesma lógica.
O questionamento e as denúncias feitas às grandes redes, na forma de comercializar, na qualidade e principalmente na forma de negociar a produção produzida com tanto esforço, forçando os agricultores a vender estes produtos por preços não justos, através de cartéis criados para e com esta intenção vem crescendo. Para estas redes o importante na hora da compra é o desequilíbrio entre o preço de compra e a qualidade, o produto tem que ser o melhor e o preço deve ser o mais baixo, não levando em conta o sistema de produção que foi utilizado, os serviços ambientais realizados. Todo este sistema desumano força os produtores a também utilizar os mesmos métodos de explorar o trabalhador, a natureza e mais quem por perto desta cadeia se aproxima ou sobrevive.
As grandes corporações e redes compram explorando os produtores e colocam estes produtos em suas lojas de revenda onde o próprio nome da loja de forma indireta demonstra que alguém esta sendo explorado “Barateiro, Melhor preço, Bom preço”, e tantos outros. Mas, poderíamos fazer a seguinte pergunta: Como se chegou a este menor preço? Quem paga pelo menor preço?
E para que a natureza possa gerar produtos baratos, não lhe dão nada de volta, é só tirar, tirar e tirar, exploração direta e permanente, e quando pensam em devolver algo são produtos artificiais, aumentando mais uma vez os desequilíbrios da natureza como também os financeiros das famílias envolvidas nesta atividade.
A revolução verde ainda está muito viva e ativa, não perdendo espaço com facilidade. A sua resistência cultivada por uma mídia que só pensa na venda do marketing e no aumento do querer comprar, torna-a ainda muito forte. A globalização dos mercados trouxe graves conseqüências principalmente para os pequenos agricultores, que vêem os preços dos seus produtos caírem, numa injusta disputa do mercado com produtores de outros países que tem seus custos de produção menores devido ao uso de um aparato tecnológico de máquinas projetadas e de subsídios governamentais.
Parece que toda lógica da agricultura esta centrada na busca permanente da elevação da produtividade, dos ganhos em escala, da homogeneização das dietas e dos processos produtivos, além da desregulamentação dos mercados. Como mudar esta onda? Toda esta lógica não pode ser a única racionalidade operante no âmbito do sistema agroalimentar. Diante desta situação vem surgindo várias atitudes que enfrentam esta situação de frente e de forma muito criativa e em muitos casos inusitadas.
POSSIBILIDADES ALTERNATIVAS DE ENCURTAR O CAMINHO
PARA VENDER E COMER MELHOR
Este momento é para quebrar a monotonia dos plantios, da colheita, da venda e do consumo, nesta etapa se quer criatividade em todos os aspectos. Não basta produzir tem saber vender e comer. A lucratividade tem que ultrapassar os limites meramente econômicos. Tem que saber ser criativo para criar a vontade da compra sem ter quer ir vender tão distante. Como trocar produtos? Como planejar uma produção diversificada? Como ter uma auto-suficiência alimentar que atenda a minha família e a dos meus vizinhos? São estes pensamentos e atitudes que se quer provocar.
VENDA PORTA A PORTA – Direto ao consumidor, da roça ao consumidor, como normalmente se coloca este slogan. Muitas iniciativas compõem este quadro mercadológico, que não é novo, já se praticava a muitas décadas atrás. Em muitas cidades interioranas e até em algumas cidades grandes, este tipo de venda vem crescendo. E na sua maioria estas vendas são realizadas pelo próprio produtor, na tentativa de vender todos os dias e a vista. Voltando a ter contato direto com o consumidor, ouvindo os pedidos, as sugestões de cultivos. Esta demanda de intenção para a produção cria um novo nicho de mercado muito mais humanizado e até ecológico, dependendo do nível de consumo consciente da família envolvida na produção e no consumo. Mercado exigente em qualidade, na aparência, pois escolho na porta e pago até mais caro por este tipo de serviço que se pode até ser considerado um “DELIVERY SEM SER PEDIDO”e na porta do condomínio, da entidade, do escritório e da casa toda semana.
FEIRAS LIVRES DE PRODUTOS ORGÂNICOS – O número de feiras com esta característica de produtos é crescente. O não crescimento vertiginoso não é por falta de demanda, mas sim por falta de oferta de produtos. A procura por produtos limpos está tendo uma grande aceitação nos mercados. É uma pena que este consumo ainda é privilegio de algumas classes sociais, devido a pouca oferta que termina por influenciar o valor econômico dos mesmos. Mas, este nicho de mercado é uma ótima alternativa de encurtar a distância entre a produção e consumo. Nas feiras livres de produtos orgânicos quem vende é quem produz, e mais uma vez cria-se um contato direto entre o produtor e o consumidor.
HORTAS ORGÂNICAS URBANAS – Em algumas cidades esta prática vem sendo operacionalizada. Terrenos baldios são utilizados para a produção de hortaliças as mais variadas tendo como objetivo criar pontos de vendas onde o consumidor Vê, Escolhe e Paga. É quase a mesma lógica do pesque e pague. É uma alternativa fantástica, pois nesta modalidade o contato é feito com o produtor e com o produto ainda plantado, vivo, podendo ser colhido por ele mesmo. Ele pode acompanhar a vida do seu próximo pé de alface, de rúcula, etc., pois a cada compra de um ele vê o outro sendo produzido.
FEIRA NA ROÇA – É uma atividade nova, mas que promete muita adesão são as feiras na roça. É uma modalidade onde os compradores vão fazer sua feira na roça. Os produtores expõem seus produtos colhidos normalmente no mesmo dia, além de vender outros serviços como o pesque e pague, pode ver, ouvir e dançar uma moda caipira, além de poder se deliciar com a gastronomia do lugar feita pelos agricultores da comunidade envolvida. É um dia de festa para todos. Para os que vem comprar e para os vão vender. Encurta-se também a distância entre o urbano e rural, aumentando os vínculos e quebrando preconceitos. Estas feiras não devem acontecer semanalmente na mesma localidade para evitar a rotina. É um dia festivo onde toda a cultura do campo pode ser mostrada, gerando dividendos econômicos.
VENDAS VIRTUAIS – A compra sem sair de casa, também já faz parte da modernidade virtual. O pagar para alguém escolher e vir entregar encanta muitas famílias. É uma comodidade para quem não tem quase tempo, passa o dia inteiro dedicado a outras atividades, mas precisa se alimentar bem, biologicamente falando. Algumas organizações de produtores e até particulares exploram este tipo de mercado, que também vem em ascensão permanente, e mais uma vez é limitado não pela pouca procura, mas pela pouca oferta de produtos orgânicos. Todas as semanas estes sites fazem um levantamento de produtos que os produtores estão oferecendo, montam planilhas e expõem virtualmente tipos e quantidades ofertadas, estas vendas podem ocorrer virtualmente ou até por telefonia. A entrega tem data e hora muitas vezes pré- marcada. O cliente não vê o produto que esta comprando, mas imagina seu formato, tamanho, grau de maturação, este tipo de venda necessita um tempo para que se possa ter e entender o gosto e as preferências de cada cliente virtual.
COOPERATIVAS DE CONSUMO – É outra, alternativa criada por consumidores para garantir produtos de qualidade com rastreabilidade conhecida, muitas vezes in locu, com visitas, participando até do planejamento da produção com os grupos de produtores, que vão atender a demanda do grupo. Estes produtores precisam conhecer a relação de produtos da demanda semanal e vê as possibilidades ambientais e de infra-estrutura para fazer ou não o atendimento. Em alguns casos o grupo de consumidores até financiam antecipadamente a produção. A fidelidade, confiança e a educação cooperativista são alguns dos principais valores trabalhados por todo grupo (produtor e consumidor).
A AGRICULTURA URBANA COMO GRANDE ESTRATÉGIA DE ENCURTAR DISTÂNCIAS E DIMINUIR CUSTOS
Segundo estimativas feitas pelo ETC Group (2009), 50% alimentos produzidos no mundo são cultivados por camponeses, 12,5% por caçadores e coletores e 7,5% por agricultores urbanos.
A soberania alimentar deveria ser pressuposto para todas as famílias. A produção de seu próprio alimento deve ser uma das primeiras preocupações na ocupação de qualquer espaço habitacional.
Tanto nas grandes cidades quanto nas pequenas sempre surgem espaços ociosos, que muitas vezes são transformados em depósitos de lixo a céu aberto. Terrenos baldios, praças, quintais, enfim procurando vamos encontrar. Estes espaços poderiam ser transformados em locais de produção de alimentos os mais variados. Poderiam gerar rendas para entidades sociais como abrigos, asilos, criando ocupação ambientalmente correta além de cumprir uma função social importantíssima, criar espaços para diminuir a ociosidade, a inutilidade pessoal que muitas pessoas sentem, quando estão aposentadas, esquecidas nos asilos, ou até desempregadas, etc. Estes espaços também podem profissionalizar muitas pessoas, ensinando um novo ofício, que com pouco investimento e pouco tempo geram uma complementação nas economias das famílias.
Além de todas estas funções sociais e ocupacionais, podem também aumentar a oferta de alimentos sadios produzidos organicamente nos bairros. Podem facilitar o acesso à compra de produtos frescos todos os dias, pois estes espaços estão ao lado das casas, próximos de tudo e todos.
A AUTOPRODUÇÃO PARA O AUTOCONSUMO
É a tentativa também de mudar os hábitos de vida urbana, de aumentar a conexão com a natureza viva e produtiva. A contemplação a estética natural do verde do alimento colorido, plantando e cultivado ali pertinho de mim e por mim, é uma nova condição que muitas famílias estão adotando para encurtar mais ainda a distância entre o produzir e o consumir. Praticas como o quintal produtivo, a parede produtiva, hortas em apartamentos, agricultura de lugar, entre outras formas, são todas alternativas para diminuir estas distâncias, é praticar a COZINHA 0 KM, é não ter que andar muito para colher o comer.
Além de ser considerado para alguns como hobbies, gerando qualidade de vida não só espiritual, mas também corporal através dos alimentos energizados que são produzidos nestes espaços. Alimentos produzidos com prazer, com dedicação e carinho só podem fazer muito bem a saúde de quem produz e de quem consome. O espaço habitacional fica muito mais naturalizado e esteticamente muito mais bonito e elegante, fino, demonstrando o tipo de vida que esta família acredita e quer.
A satisfação de comer uma hortaliça ou qualquer outro alimento tutelado por você é de um prazer inexplicável, o sabor é outro, o prato tem outra beleza, as cores são outras, são cores que transbordam saúde.
A SELEÇÃO E O BENEFICIAMENTO ATRAEM CONSUMIDORES E ENCURTA DISTÂNCIA
A comodidade e a praticidade hoje é um dos pré-requisitos que os produtos precisam ter para que sua procura seja crescente. Boa parte da população das grandes cidades trabalhão, disponibilizando de pouco tempo para preparar suas refeições, logo, a busca por produtos pré-prontos, já beneficiados começa fazer parte da cultura de muitas famílias urbanas e até rurais.
O beneficiamento destes produtos precisa acontecer ainda na propriedade, como forma até de profissionalizar a família do agricultor/produtor, além da personificação dos seus produtos através de receitas ancestrais que vem sendo passadas de mãe para filha.
Muitas propriedades estão adequando sua cozinha para se tornar uma pequena agroindústria, com capacidade e eficiência para desenvolver através do beneficiamento alguns produtos, é a arte da engenhosidade do fazer e do agregar valor ao que se fez com o produto, é a quantidade certa da mistura, da dosagem, do ponto ideal, que vão dar outro valor a este produto, fortalecendo os laços da cultura e do pertencimento aquela família, ou até aquele território. É a receita da vovó voltando a ter valor, não só sentimental, mas agora também no econômico. O velho com o toque moderno da embalagem, da forma de expor o produto com a receita antiga.
FECHAMENTO
Este tipo de mercado alternativo não permite que os produtos comercializados viajem grandes distâncias, pois a qualidade e o frescor dos alimentos é um dos principais atrativos, e chamariz para que a compra se realize. Logo, todo o gasto com energias é reduzido contribuindo com o meio ambiente. O consumidor por saber o que está comprando e quem está produzindo torna-se mais exigente nas formas de produção, não quer que use este ou aquele insumo forçando um serviço ambiental através da demanda para uma oferta limpa e dentro dos padrões e normas da produção orgânica.
Neste contexto todos ganham, pois o meio ambiente diretamente é levado em consideração na hora do como plantar com menos impactos. Cria-se um ambiente altamente propício para a divulgação de práticas ecologicamente corretas, o ambiente alfabetizador é criado.
04 de maio de 2012
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