Antônio
Roberto Mendes Pereira
Onde o sertanejo aprende a lidar com a
agricultura e com as criações?
É impossível compreender onde se
dá esta aprendizagem sem conhecer a vida dos sertanejos. A luta pela vida faz
dele um experimentador nato, testando isso e aquilo, sempre buscando aprender
mais um pouco com a realidade que esta vivendo. A vida primitiva e simples que
ele tinha antes, está se tornando moderna, perdendo todas as características do
testar primeiro antes de aumentar a quantidade a ser produzida. Toda esta
cultura está sendo modificada pela entrada da era do conhecimento onde se não se
conhece bem o que se faz não está apto para competir no mercado.
Os modelos clássicos de ensinar e
aprender novos conhecimentos ou porque não dizer conhecimentos significativos está
ficando superados, precisa-se de formas inusitadas de provocar esta
aprendizagem. Os modelos pedagógicos utilizados e todos seus instrumentais já
não estão alcançando resultados satisfatórios.
E a cada dia, a necessidade por novos
conhecimentos vem aumentando. O produzir vem exigindo mais informações, mais
conhecimentos. Para fazer agricultura é necessário ter mais conhecimento que
antes. Com apenas o conhecimento cultural que a maioria das famílias possui é
impossível praticar uma agricultura que lhes traga rentabilidade de forma
permanente, justa e ambientalmente correta.
Anteriormente com a experiência e
o saber dos avôs era suficiente para praticar uma agricultura produtiva e
rentável, pois os solos respondiam a todos os estímulos nele incorporado. A
prática da agricultura neste momento histórico e geológico era mais fácil. A
população a ser alimentada era menor e os solos ainda estavam com toda sua
carga de fertilidade natural. Havia mais
equilíbrio no ambiente das propriedades, mas pelo uso de um sistema de produção
criado e divulgado pela revolução verde através do uso de insumos químicos e de
um manejo inadequado, estes solos foram exauridos, não respondendo mais aos
conhecimentos e experiências que as famílias possuíam.
O mundo moderno está
permanentemente progredindo, será que é bom os agricultores acompanharem este
progresso do produzir sempre mais? Onde ele vai aprender estes novos
conhecimentos? Quem vai selecionar estes conhecimentos? Com qual intenção?
Atualmente, os espaços para
aprender novas formas de fazer agricultura são poucos. A escola do campo, que
deveria assumir um papel social de produzir conhecimentos sobre o espaço do
campo, não o faz, repassa conhecimentos de pouca ou nenhuma serventia para a
lida do roçado, e da propriedade como um todo. É como se esta escola preparasse
os jovens não para saber viver e lidar no campo, e sim para retirá-las deste
espaço, conduzindo estes jovens e seus pais para os centros urbanos,
estimulando o êxodo rural, e o envelhecimento e a masculinização deste espaço.
Os instrumentos de mídia como a
TV através das emissoras são as grandes vedetes e vendedoras de insumos
químicos para uma prática de agricultura onde os meios de produção não são
levados em conta, polui o solo, o ar, a água e as pessoas que destes alimentos
consomem e produzem. O solo que deveria ser à base da saúde das pessoas hoje é
o meio de produção de alimentos de baixa qualidade biológica, além de estarem
desbalanceados, quando comparados aos produzidos naturalmente.
Pelas pesquisas apresentadas
sobre alimentos contaminados muitos produtos são verdadeiros alimentos recheados
de venenos e outras substâncias cancerígenas e intoxicantes. Os programas de TV
dedicados as ciências agrárias são veículos que utilizam a mídia e o marketing para
o aumento das vendas de todos os tipos de insumos, que contribuem para a baixa
qualidade biológica dos alimentos e degradação dos solos. Divulga-se o aumento
de produtividade através do uso destes insumos, mas pouco se divulga os males
que estes insumos podem e causam ao ambiente e as pessoas.
A assistência técnica
infelizmente segue a lógica da agricultura moderna para o aumento do uso de todo
um pacote tecnológico centrado no uso de máquinas, aumentando o gasto com energia,
aumentando a relação “energia aplicada versus energia produzida ou resgatada”.
O sistema de produção que é divulgado como a fórmula para a proteção e produção
é o baseado nas pesquisas que também são norteados pela mídia para acompanhar a
modernidade produtiva. Alegam que o Brasil não pode ficar a reboque das
pesquisas dos outros países que dedicam investimentos em pesquisas na área dos
transgênicos, dos híbridos, da monocultura, etc.
Os extensionistas são preparados
para prestarem uma assistência ao uso destes produtos. É dada uma assistência
ao produto, e não a propriedade como um todo, ela é vista unicamente como uma
unidade produtiva, não transcendendo a produção. Não se acompanha a propriedade na sua
inteireza, não se está preocupada com a saúde da família, com a educação, com o
meio ambiente, com a cultura local. Em muitos casos é uma assistência que
estimula o paternalismo e a concentração do saber, pois a visita é feita ao pai
e não a família. A família não é envolvida no processo nem da visita e muito
menos do acompanhamento. Ela é protagonista do filme mais não sai na legenda. O
protagonista é o técnico e seus ensinamentos e a família é mero objeto da ação
deste protagonista.
Como vimos às entidades e os
atores sociais que poderiam fazer diferente, ensinar diferente, produzir
diferente, acompanhar diferente, não fazem nada de diferente, estimulam e
perpetuam o modelo de desenvolvimento que hora esta vigente e divulgado pela mídia
e legitimada pelo governo nas suas políticas de ATER (assistência técnica e
extensão rural).
Diante de todos estes fatos como
fazer para que os agricultores possam aprender e até repensar seus
conhecimentos?
Onde aprender? Quem vai ensinar?
Este texto pretende trazer
reflexões e sugestões para estes desafios que hora são impostos a realidade
rural. Não pretende esgotar o tema, mas influenciar na reflexão de como
melhorar as aprendizagens dos agricultores independentemente de uma assistência
técnica ou outra forma para se aumentar os conhecimentos.
Os conhecimentos empregados nas
zonas[1]
0, 1, 2, 3 e 4 deveriam ser aprendidos na própria propriedade. As propriedades
precisam ter um sistema educacional próprio e local, onde as demandas por conhecimento
fossem primeiro analisados, comparadas e estudas no local e tomadas às decisões
necessárias. A zona 05 na Permacultura é este espaço privilegiado para esta
produção de conhecimento. É o espaço onde a natureza deve estar na sua forma
original, espaço onde o homem não intervém, simplesmente aprende, estuda, verifica
como a natureza agi, faz e executa. O sistema educacional da propriedade é este
espaço, onde tudo que vou fazer nas demais zonas devo primeiro entender como a
natureza operacionaliza cotidianamente.
Aprender com as plantas, com os
animais, com os insetos, aprender com a passarada, com a chuva, com o vento,
com o sol é o caminho para uma aprendizagem duradoura e por que não dizer sustentável.
Entender como acontece à integração entre todos estes elementos sem nenhum
subjugar os demais é uma lição para ninguém esquecer jamais. Espaço de
parceria, de interdependência, de conexão, de combinação é tudo que se precisa
aprender para se montar os agroecossistemas cultivados. Espaço perfeito de equilíbrio
desequilibrado, de caos ordenado, de mistura, de tudo junto e misturado.
A matemática deste espaço é
fantástica: pesar, medir as distâncias, a quantidade, a diversidade, as
relações e equações para a resolução. Alguns pensadores da antiguidade diziam
que a linguagem que a natureza utiliza para se expressar é a matemática, numa
visão simplista. Mas ela é muito mais complexa e complicada do que se pensa.
Deve ser também considerada como
área de observação e contemplação. É o espaço onde ao se contemplar percebe-se
a grandeza da natureza. Sua magnífica complexidade onde tudo e todos estão
ligados de forma simbiótica e harmônica. Onde tudo que nasce e cresce é
espontâneo, completo e singelo.
A partir
deste espaço posso aprender e entender conexões, tipos de consórcios, altura
máxima das árvores daquela região adaptada ao tipo de solo, a umidade presente
e permanente. Ela dá o norte dos cultivos das outras Zonas. É o santuário da
propriedade onde abriga e protege a fauna e a flora nativa daquela região.
Preserva o material genético de muitas plantas e animais. Além de ser a maior
seqüestradora de carbono de toda a propriedade.
APRENDENDO COM A ZONA 05
1.
Quantidade
de matéria orgânica necessária por metro quadrado. Coletando e pesando toda a matéria
orgânica que está presente no solo em um metro quadrado, tem-se a média de
biomassa que deve voltar ao solo de forma permanente para manter a fertilidade
e bioestrutura daquele espaço. A imagem ao lado mostra a coleta da matéria orgânica
em 1 metro quadrado para posterior pesagem.
2.
Observar a
altura máxima das árvores desta Zona, este é um bom indicador para saber mais ou menos o porte das árvores que
aquele solo pode suportar. Ajuda-nos a não cometer erros na escolha das
culturas e do seu porte.
3.
É uma fábrica
de solo equilibrado e rico. O retorno de matéria orgânica diversificada e a
quantidade de funcionários (microorganismos do solo) que decompõe e liberam os
nutrientes de forma dosada e gradativa para as plantas. É a melhor fábrica de
terra boa que uma propriedade pode ter. Ela nos ensina como fabricar esta terra
no seu laboratório natural.
4.
A quantidade
de plantas encontradas por metro quadrado também é um grande indicador da
capacidade de suporte do solo. Pode-se contar esta quantidade de plantas,
observando as espécies, os formatos e tentar imitar esta quantidade e formas
nos plantios das Zonas 01, 02 e 03.
5.
O jogo de
luz deve ser observado e imitado. A natureza sabe como dosar a quantidade de
luz para todas as plantas que compõe o espaço. As plantas que precisam de mais
luz estão em cima as que precisam de menos estão em baixo, e todas as
necessidades são atendidas. Distribui quantidades de luz não iguais e satisfaz
a todas ao mesmo tempo.
6.
Os andares
da mata também são uma forma de arrumação que precisa ser entendida e imitada
nas demais Zonas. Os andares estão ligadas a otimização dos espaços. Como
melhor aproveitar os espaços, os nutrientes, a água e a luz.
7.
Outra grande
aprendizagem da floresta natural é como guardar a umidade do solo. Ela faz isso
de forma brilhante sabendo dosar a água que está no solo até que um novo
abastecimento natural venha acontecer (chuva). Ela utiliza uma cobertura
natural de folhas que evita a evaporação, conservando toda água de forma
disponível para as plantas. As florestas transpiram água para o ar. Elas são
como bombas biológicas. Nas áreas florestadas chove de 5 a 6 vezes mais do que
nas áreas não florestadas.
O efeito da presença da vegetação
abundante leva as mudanças na precipitação das chuvas, na quantidade, na
qualidade da água, na distribuição e na temperatura interna do ambiente. Chove mais.
Cria-se um microclima.
A Zona 05 é abrigo de várias
espécies nativas de animais silvestres como, por exemplo: cobras, lagartos,
felinos, pássaros diversos. Que ajudam no controle ecológico de várias outras
espécies.
Se os
roçados continuarem sendo à base dos conhecimentos para as demais áreas da
propriedade e para a reprodução familiar, a lógica produtiva vai continuar a
mesma. Todo lógica antinatural vai continuar servindo de referencia. O que se
pretende é que o modelo para todas as áreas ou zonas da propriedade seja a
floresta na zona da mata e a caatinga no sertão. Espaços intactos destes biomas
precisam voltar a existir em parte das propriedades para servirem de sistema
educacional e inspirar a operacionalização das tarefas produtivas de toda a
propriedade. Sistema educacional onde o professor é um conjunto de equilíbrios
instaurados pelos elementos presentes nos ecossistemas naturais. Este espaço
está até garantido na lei do código florestal brasileiro – lei nº 4.771/1965 que criou o espaço de Reserva legal nas
propriedades (20% as área) que deve ser mantida para conservação da vegetação nativa, como
abrigo da fauna e flora. A partir desta proposição minha estou dando mais uma
grande utilidade para esta reserva legal a de servir de inspiração para
operacionalização da gestão de toda a propriedade.
Espero que a partir da
implantação ou recomposição possamos ter agricultores orgulhosos em ter uma
área de conservação da natureza e ser reconhecido como protetor desta natureza.
Além dessas vantagens podemos citar vários outros como aumento da área de
captura de carbono, está cumprindo parte de sua cidadania ambiental e ser
seguidor da lei ambiental conservando o maior bem da humanidade o meio ambiente
e seus recursos. Recompor a
área de aprendizagem é deixar que Zona 05 na propriedade caso não exista que
ela possa se refazer de forma natural, sem a pressa humana. A natureza sabe
como fazer para se recompor só não necessita da intervenção humana. Que ele não
mexa, não tire, e que o crescimento espontâneo seja o caminho que a natureza
utilize. Durante a recomposição aprenda com a natureza, observe como ela faz,
veja os detalhes, os consórcios, os ciclos.
A produção de informação deve
acontecer em todas as áreas da propriedade, mas o fluxo correto para uma
analogia perfeita com a natureza deve ser:
Sistema educacional tem a
informação, o homem pesquisa, verifica, aprende se apropria e tenta utilizar as
aprendizagens nas demais áreas ou zonas da propriedade. Todas as vezes que nos
depararmos com um problema produtivo pergunte a mata e a resposta vai lhe ser
dada através da observação de como acontece e da forma mais correta que possa
existir. E não esqueça a zona 05 é interdisciplinar no ensino e na
aprendizagem. Este espaço é tão completo e multidimensional que pode orientar
como deve ser o comportamento humano para viver em grupo.
E quanto ao espaço de testar as
aprendizagens não tem melhor que o terreiro da casa (zona 01), espaço próximo
que pode ser acompanhado todos os dias sem muito esforço. Além de ter vários
alunos fazendo, vendo, tocando praticando os procedimentos análogos orientados
pela natureza. É um espaço privilegiado para a experimentação em pequena escala
para depois se fazer a transferência para as demais zonas de produção inclusive
a comercial.
A recomposição deste espaço (zona
05) é a garantia de liberdade de aprender, de se libertar da assistência
técnica que na maioria das vezes vem com intenções adversas e diferentes as da
natureza. Aprendendo formas de fazer sem ter que comprar nada, sem poluir, sem
danificar o meio onde se vive e se produz. É por isso que afirmamos que a mata
ou floresta, ou até a caatinga são grandes espaços de aprendizagens, que podem
nos servir de modelo para quaisquer outros espaços.
“Este mundo está farto de grandes soluções. Está
cansado de gente que sabe exatamente o que há para se fazer. Está aborrecido de
gente que anda com a ‘pasta cheia’ de soluções buscando problemas que se
encaixem com as suas soluções. Creio firmemente que devemos começar a respeitar
um pouco mais a capacidade de reflexão do povo em relação à natureza (e de
solução do povo) e o poder do silêncio” Eros Marion Mussoi.
Valorizar a diversidade étnica e cultural da espécie
humana e fomentar diferentes formas de manejo produtivo da biodiversidade, em
harmonia com a natureza é o caminho para as transformações necessárias.
Recomponha este espaço e desfrute das aprendizagens perpetuantes.
16 de abril de 2011
[1]
Zoneamento – Divisão da propriedade pela intensidade e freqüência de uso de
energia utilizado pela Permacultura nas propriedades.
deve-se entrar em consenço os conhecimentos adiquiridos pelos tecnicos das ciençias agrárias em suas formações e os conhecimentos adiquiridos pelos produtores em suas gerações e jutos ambos devem entender,respeitar e imitar os saberes da natureza para que realmente se tenha uma propriedade agroecologica sústentavel.
ResponderExcluirautor: Dmião De Souza Melo
Deve-se entrar em consenço os conhecimentos adiquiridos pelos técnicos das ciençias agrárias em suas formações e os conhecimentos adiquiridos pelos produtores rurais em suas gerações familiares e juntos devem entenderem, respeitarem e imitarem os saberes da natureza prara que realmente tenha-se propriedades agroecologicas sústentavés.
ResponderExcluirAutor: Damião Souza Melo.