Antônio Roberto Mendes Pereira
A escrita marcou a passagem da humanidade da pré história para a história. Sem ela, hoje não conheceríamos muitos detalhes da época vivenciada pelos antepassados. Como por exemplo: como viviam, onde viviam o que cultivavam como era sua organização econômica, social, política e até a sua relação com o meio ambiente. Todos estes dados passaram do momento vivido e se tornaram um legado para as futuras gerações através da escrita.
A escrita permitiu uma forma de registrar suas idéias e de se comunicar. O código escrito permite que a vida que levamos seja conhecida pelas gerações que virão depois de nós. Diante deste exposto pergunto: a história da sua propriedade está sendo escrita, registrando os fatos os dados, os sucessos e os insucessos? Se não, é uma pena, pois muita história está se perdendo, que poderia no futuro ajudar seus netos, bisnetos a conhecerem realmente o que aconteceu para que este ambiente esteja dessa ou daquela forma.
Este texto tem a intenção de mostrar a importância destes registros, principalmente nas pequenas propriedades. Quais as aprendizagens que se pode ter a partir da operacionalização do uso dos registros.
OS NÚMEROS COMO UMA DAS PRIMEIRAS FERRAMENTAS DE REGISTROS
Os números estão tão presentes em nossa vida que nem nos damos conta disso. Vamos pensar no nosso cotidiano, entre ontem e hoje, quantas vezes você se envolveu com eles?
Investigar a origem dos números é investigar a origem da humanidade. Há 50 mil anos, as pessoas viviam em grupos pouco numerosos, alimentavam-se da caça e coleta de frutos e raízes, abrigavam-se em cavernas para proteger-se do tempo e dos inimigos. Eles não comerciavam e não usavam dinheiro, não plantavam, não criavam animais e nem construíam suas casas. Com o passar de muitos anos, esse modo de vida foi se alterando... O homem deixa de ser apenas caçador e coletor de alimento e passa a ser agricultor. Passa a capturar animais para tê-los como reserva de alimento, aprende a domesticá-lo e aproveitar-se do que ofereciam... Assim foram evoluindo!!! A agricultura e o pastoreio provocaram inúmeras mudanças na vida do homem. Passaram a se organizar e a viver em grupos, a reservar alimento para atender a população que crescia. Com o sentimento de propriedade (animais, terra e produtos dela extraídos) o homem desenvolveu o comércio rudimentar e o sistema de trocas. Nos primeiros tempos, para contar eram usados os dedos, pedras, os nós de uma corda, marcas num osso...
Para controlar o rebanho e ter certeza de que nenhuma ovelha havia fugido ou sido devorada por algum animal selvagem, usavam pedras. Cada ovelha que saía para pastar correspondia a uma pedra. O pastor colocava todas as pedras em um saquinho. No fim do dia, à medida que as ovelhas entravam no cercado, ele ia retirando as pedras. Que susto levaria se após todas as ovelhas estarem no cercado, sobrasse alguma pedra!
Daí decorre a palavra Cálculo, que em latim quer dizer “contas com pedras”.
A modernização da agricultura, durante o século XX, trouxe consigo a idéia de eficiência produtiva, ou seja, necessidade de maximizar e otimizar o uso dos fatores de produção, a fim de obter maiores resultados produtivos. O uso dos recursos naturais sofreu grandes explorações para atender a esta rentabilidade. Porém com o passar dos anos os recursos chegaram ao seu limite, e toda a rentabilidade entra em decadência, exigindo do agricultor mais conhecimento.
A forma explorativa do uso dos recursos naturais não devia ser a postura adequada de uma pessoa que se diz agricultor. Diante dessa postura precisa-se aprender uma nova forma de re-fertilizar os solos a fim de torná-los novamente produtivos. E para que se percebam os incrementos que se está conseguindo se faz necessário registrar uma série de informações que além de nos mostrar os resultados também podem nos ajudar a conhecer onde precisa efetuar maiores intervenções.
AS APRENDIZAGENS QUE SE PODE TER COM OS REGISTROS
ETAPAS METODOLÓGICAS
1. CONHECER – Esta deve ser uma das primeiras intenções da postura do registrar, do arquivar, elas nos remetem a conhecer melhor o que estamos operacionalizando. E também evita o esquecimento e os achismos, é preciso diminuir a probabilidade de erros e enganos nas tomadas de decisões. É preciso conhecer para verificar se o que estamos aplicando e fazendo está trazendo resultados que compensem a sua aplicação de forma permanente. A curiosidade é a chave básica para o conhecer, logo, esta fase necessita que as pessoas tenham a postura de um pesquisador, curioso para fazer descobertas.
2. ANALISAR – Depois de nos aproximar do objeto do conhecimento que se quer ter e conhecer, precisa-se alargar este conhecimento. E para que isto ocorra se faz necessário analisar, estudar os dados coletados, registrados, tentando entender, compreender o que estes registros estão querendo me dizer. Este entendimento é a chave para os próximos passos. Para que este analise aconteça é preciso utilizar a comparação entre os dados registrados, esta comparação nos remete a cada vez mais aprofundar e entender o objeto de conhecimento e seus resultados operativos.
3. CONTROLAR – A partir do entendimento da análise, precisamos iniciar o processo da tomada de decisão. Esta decisão nos remeteu a escolher por continuar fazendo da mesma forma ou mudar alguns requisitos ou mudar totalmente. O controle agora vai ser a partir destas novas iniciativas. Os registros nos ajudam também a ter controle sobre nossas ações. Ela nos ajuda a medir, a quantificar, a mensurar toda atividade que se está operacionalizando.
4. MELHORAR – Esta decisão e o controle das novas medidas nos levam a tentativa de melhorar e potencializar cada vez mais o que estamos fazendo. Sem estes registros seria quase que impossível ter certeza se entre a forma A, B ou até C qual delas está contribuindo no alcance dos melhores desempenhos e resultados. A perspectiva que se quer é a melhora do que vem se fazendo em toda a propriedade.
VANTAGENS DO USO DOS REGISTROS
Muitas vantagens podem ser atribuídas ao uso do registro como forma metódica de acompanhamento as atividades desenvolvidas internamente na propriedade. Vejamos algumas que chamam atenção:
· Mostrar os gastos dos diferentes setores da propriedade;
· Possibilita calcular os rendimentos das diversas culturas e criações, ou de outras atividades;
· Permite a determinação do volume e aquisição de produtos;
· Indica as melhores épocas para a venda e aquisição de produtos;
· Permite o cálculo dos custos da produção;
· Permite o cálculo das medidas dos resultados econômico das atividades desenvolvidas;
· Facilita a comparação dos resultados entre a mesma atividade e atividades diferentes;
· Cria o histórico da propriedade.
Não é costume de nossos agricultores registrarem os resultados alcançados ano após ano. O resultado normalmente fica arquivado na memória passível de esquecimento e de difícil possibilidade de se fazer comparações. Faltam detalhes numéricos, e sem estes a tarefa de descobrir por qual vai se optar continuar fazendo ou mudando torna-se difícil. Hoje as necessidades aumentaram, exigindo mais conhecimento e controles, para se alcançar melhores resultados. A concorrência é grande e em muitos casos desleais, colocando em cheque a qualidade e a quantidade produzida.
Sem os registros é quase que impossível lembrar-se das produções diárias.
A lucratividade precisa ser medida, conhecida, verificada de forma quase que cotidiana. O aperfeiçoamento do que se faz é necessário. O registrar para aperfeiçoar não quer dizer aumentar o uso de insumos, ou aumentar o uso de tecnologias de produto, o que se está procurando é que através dos registros possamos cada vez mais entender a lógica da natureza para que a partir deste conhecimento possamos imitar a mesma tendo a lógica da sustentabilidade como o norte de tudo que estamos fazendo e implantando nas propriedades.
O que eu fiz de diferente que me fez alcançar estes resultados? Sem os registros é difícil saber o que foi? Como foi? E quais quantidades usaram?
A ADMINISTRAÇÃO RURAL
É impossível ter controle administrativo da propriedade rural sem ter uma série de registros. A administração rural é passível de controles, anotações que possam criar bancos de dados que facilitem as interpretações dos dados que se tem, para as tomadas de decisões. A administração rural tornou-se uma alternativa para se identificar os principais gargalos dentro dos sistemas produtivos, levantando informações que possam gerar intervenções a fim de aumentar a sua eficiência. Como dito anteriormente, observa-se que ainda hoje boa parte dos produtores rurais adota decisões condicionadas apenas à sua experiência, à tradição, potencial do agroecossistema e região e à disponibilidade de recursos financeiros e mão de obra. Os produtores até que percebem a baixa rentabilidade, mas tem dificuldade em quantificar e identificar os pontos de estrangulamento do processo produtivo. Daí a necessidade da cultura do uso dos registros e controles. Todos estes dados são uma grande ferramenta de análise que pode ajudar as propriedades a diminuir seus riscos.
O produtor rural precisa adotar práticas de gestão para a condução profissional do seu negócio. Isso significa, por exemplo, que não basta apenas conhecer a sua produtividade, mas também quais são os seus custos. Não são raros os casos de produtores cujas lavouras alcançam altos índices de produtividade, porém, acompanhados de custos de produção muito elevados que inviabilizam o resultado financeiro positivo do negócio. Por isso a estruturação e o aprimoramento dos processos de gestão no campo são tão importantes. Eles proporcionam ganhos de competitividade e sustentabilidade do negócio agrícola no longo prazo. O produtor rural profissionaliza-se e torna-se um empresário rural.
REGISTRAR SEM COMPLICAR
Um dos grandes desafios de assumir uma cultura que tem o hábito de registrar é justamente tornar esta prática em um ato simples e rotineiro e até prazeroso. Muitas das fichas que são utilizadas não levam em conta o nível educacional da família. Tornando este ato, em um momento de esforço, que para muitos é preferível não o fazer. Um dos segredos que torna este ato simples, esta na escolha do que será registrado e na forma do preenchimento destas fichas. Logo, é necessário ter em mente que a quantidade de informação gerada, o preenchimento e a interpretação deste controle devem levar em conta o grau de instrução e a facilidade para seu preenchimento. A facilidade para fazer as comparações com os resultados anteriores precisam ser de fácil análise, que estes resultados saltem aos olhos, que não precise de um esforço intelectual muito grande para o alcance das conclusões.
Seria interessante envolver os filhos que estão estudando, pois o hábito diário de estudar possibilita com facilidade a inclusão desta cultura. Inicie este processo com poucos registros e com o tempo vá consolidando os primeiros resultados das interpretações e lentamente agregue novas curiosidades que você e a família querem descobrir.
Os registros não devem ser unicamente econômicos, devem ter outros alcances:
· Índices produtivos (kg por metro², toneladas por hectare)
· Zootécnicos (prolificidade, linhagem, cruzamentos, etc.)
· Climatológicos (temperatura, pluviosidade, umidade, etc.)
· Hídrico (necessidade de água por animal, planta, humano, etc.)
· Energético (M³ de lenha, GLP, óleo diesel, carvão, etc.)
· Ambiental ( número de espécies nativas, numero de animais nativos, etc.)
E se possível registrar através da fotografia. Os registros fotográficos documentam a paisagem e os detalhes da atividade que está sendo trabalhada e ou transformada. É um documento fantástico e de fácil interpretação para toda a família.
Não perca tempo anote, registre, controle o que entra e o que sai. Estes dados vão lhe ajudar a melhorar a gestão da produtividade da sua propriedade. A história da sua propriedade estará sendo documentada para que as gerações futuras da sua família possa saber como aconteceu, quando, quanto e os resultados obtidos.
20 de abril de 2012
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